“Há dias que mais vale não sair de casa, ….”Uma das coisas que me afastou de praticar ciclismo foi os acidentes fatais com atletas.
Amigos meus, ciclistas, já tinham tentado convencer-me a experimentar a modalidade.
A minha resposta era sempre a mesma:
- Ciclismo, nem pensar. Os automobilistas não respeitam os atletas na estrada. No atletismo ainda os vemos de frente. No ciclismo estamos sujeitos a ser “passados a ferro”.

Contudo, passado algum tempo, comprei a bicicleta.
Inicialmente com todo o cuidado (não sabia utilizar os pedais de encaixe, efectuar desmultiplicações… Não sabia andar.
O entusiasmo foi aumentando. Esta semana efectuei treinos diariamente entre os 40 e os 80 quilómetros. Mas… Ontem
Rolava eu descontraidamente perto de Ferreira do Zêzere, quando oiço os pneus de um carro a “chiar” em cima de mim. Só ouve tempo para sair da estrada (não havia berma nem valeta) e fui recebido por um agradável silvado que amorteceu a queda. O carro descontrolado só conseguiu para uns metros mais à frente.
O condutor veio ao meu encontro. Estava mais nervoso do que eu. Sucedeu, segundo ele, porque hesitou devido a vir um carro de frente.
Eu fiquei bem arranhado ( tive a tarefa dificultada devido aos pedais de encaixe, não consegui em tão curto espaço de tempo libertar os pés. Foi queda com os pés presos.)
Com a água do cantil lavei-me, limpei o sangue e o treino continuou.
Hoje. Percurso um pouco mais longo, 70 quilómetros.
Passei pelo local onde tive o acidente. Como eram longas as marcas da travagem no asfalto, pensei.
Percurso de uma grande beleza natural. Após Ferreira do Zêzere, dirigia-me para o concelho de Alvaiázere. Depois de passar Águas Belas, vejo ao longe uma carrinha “Bedford” bem antiga, igual à do “Zé Carrão”, carregada de feno seguida de uma fila de automóveis. Sem efectuar qualquer sinal de mudança de direcção, mesmo no entroncamento da via, o condutor entrou com a carrinha sem eu esperar. Só não me colheu porque consegui acelerar passei por cima do triângulo de cimento que se encontrava na via e fiquei espalhado na ribanceira em frente.
O septuagenário, de mitra preta na cabeça veio ter comigo dizendo:
- É caralh.., como é que eu não o vi!
O homem aflito não travou a bedford que lentamente continuava a andar sozinha.
- Olhe a carrinha, está destravada, disse eu.
Após o idoso ter colocado a carrinha em segurança, conversamos. O automobilista estava mais nervoso do que eu. Gaguejava ao falar, as asneiras e os pedidos de desculpa repetiam-se. Para o tranquilizar eu disse:
- Deixe lá amigo, não foi nada grave, podia ser pior…. E podia.
Ao afastar-se o idoso dizia para si:
Há dias que um homem não devia sair de casa caralh.. !
Zé Carrão – Proprietário da Quinta da Anunciada, Caniçal, Tomar. Local onde trabalhei na quinta, nas férias escolares entre os meus 12 e 16 anos.